sexta-feira, 13 de março de 2009

Transferência


Meu pai se separou da minha mãe quando eu tinha de quatro pra cinco anos e se casou com outra mulher (doravante, vaca – assim, minúsculo mesmo). Nossa relação, minha e de vaca, sempre foi uma montanha russa, geralmente guiada pelos interesses e oscilações de humor dela. Minha mãe, não tão preocupada com a harmonia familiar dentro da nova casa do meu pai e mais interessada em externar suas próprias frustrações nos munia de “elogios” para repetirmos para vaca quando a encontrássemos.
Meu pai com todo seu tato e sensibilidade de filho mais velho criado em uma cidade pequena da região serrana fluminense por um pai que se importava por nada mais que carros, garantia que esses elogios ficassem apenas em nossas mentes.

Isso tudo para mostrar que por toda minha infância, adolescência e vida adulta (curta que seja) se tinham duas pessoas que nunca poderiam se dar bem essas eram minha mãe e vaca. Não só pelas circunstâncias da vida, mas por personalidade diametralmente opostas também.

No meu emprego atual, que estou desde novembro de 2008 eis que me deparo com o inusitado. Está diante dos meus olhos todo o dia a negação completa da imagem que criei (ou criaram para mim) da relação entre minha mãe e vaca.

Explico.

Tem uma pessoa que trabalha comigo, é a vaca. Tenho certeza que seriam amicíssimas caso se encontrassem por aí. Mas ela é a vaca a tal ponto que há umas semanas comecei a sonhar com a vaca sem saber por quê. Até me dar conta que era a convivência com ela. O humor inteligente e refinado, a adoração pelo primeiro mundo, o cuidado com a aparência, o tratamento dos filhos, mesma faixa etária, estilo de vida. É muita coisa.

Tem também outra pessoa. Que é a minha mãe. O pacote todo também. Defeitos e qualidades. A simplicidade, jeito carinhoso com todos, receio de aceitar os presentes da vida, batalha de criar filhos sem pai presente, auto estima abalada pela história de vida, paciente.

Elas são melhores amigas. E nega o que eu tinha estabelecido como verdade. É perturbador, mas interessante observar.

ps. Gosto muito da vaca-versãotrabalho. Nos damos muito bem. O que também só serve para provar que com a vaca nunca tive a escolha. A relação sempre esteve condenada ao fracasso.

2 comentários:

Faber disse...

Tenho outra teoria: talvez o Faber ainda não tivesse lido o post. Rá!

Identifiquei logo a vaca-trabalho porque certa vez você comentou sobre o humor refinado de ambas: vaca-trabalho e vaca-original. A versão mãe-trabalho precisei de consultoria. Marina esclareceu. Se bem que a parte mãe-sem-pai-presente entregava fácil, eu que não pesquei.

Talvez hoje seja tarde demais pra recuperar a relação. Talvez nem você nem ela queiram isso realmente. Ou talvez queiram demais e o orgulho não os deixe assumir. O fato é que a relação não estava fadada ao fracasso a priori. Foi um conjunto de circunstâncias que a levaram a esse ponto.

Não precisa mais entender. O momento em que o resgate poderia ser crucial para a manutenção de uma vida mais dentro dos padrões já passou. Agora dá pra cada um seguir seu caminho, com esbarrões tão ocasionais que não parecem importar tanto.

Ou não.

Clarissa Mello disse...

Gente, andrelima.

Odeio a vaca caseira.